Por Vitória Schettini e Axe Schettini
Com o passar das décadas e com o crescimento regional, Xaxim se tornou um polo agroindustrial, gerando milhares de empregos, criando oportunidades e fortalecendo o município. No entanto, da mesma maneira que as empresas avícolas atingiram o ápice, viveram o declínio e causaram danos irreparáveis ao comércio e economia local. A Chapecó Companhia Industrial de Alimentos, que chegou a ser uma das quatro maiores agroindústrias do Brasil, foi decretada falida em 2005, mas antes disso deixou Xaxim agonizando em dívidas e preocupações, até que a Diplomata assumisse a planta, que também passou por uma terrível crise, fazendo com que encerrasse suas atividades em Xaxim em 2012.
CHAPECÓ COMPANHIA INDUSTRIAL DE ALIMENTOS
Em 1963, o Frigorífico Diadema foi vendido a S/A Indústria e Comércio SAIC, empresa oriunda de Chapecó, sendo que, na época, a unidade industrial foi renovada e aprimorada para aumentar o número da produção diária. Com o crescimento da indústria, em 25 de julho de 1974, foi fundada a Chapecó Avícola S/A e dois anos mais tarde, iniciou as atividades no ramo da avicultura. Mas a história da Chapecó Companhia Industrial de Alimentos iniciou anos antes, quando foi fundada em outubro de 1952 por Plínio Arlindo De Nês, que a presidiu até 1988.
Com 635 avicultores vinculados ao frigorífico, havia a produção de ovos para incubação, pintinhos de um dia, concentrados para aves e suínos, além de rações e a industrialização de aves para o mercado interno e externo. Além de tudo, a companhia fornecia aos produtores integrados assistência técnica, pintinhos de um dia e medicamentos.
A capacidade de abate de aves por hora era 10.500, totalizando 4.500.000 aves/mês. Quanto à fabricação de ração, a produção era de 50 toneladas por hora, com estocagem de cereais de 420.000 sacas. Os cortes de frango e congelados eram vendidos para vários Estados do Brasil, e o mercado internacional era a grande jogada da empresa, que chegou a exportar produtos para 50 países.
Por mais que a Chapecó Alimentos estivesse em seu auge, ao final dos anos 1990 uma forte crise abalou a companhia, causando uma enorme instabilidade em várias de suas unidades, inclusive a de Xaxim. A empresa, que chegou a patrocinar a Chapecoense em 1997, tinha oito unidades industriais, cinco mil funcionários e três mil produtores integrados.
Na época, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) passou a comandar a Chapecó, junto ao Banco do Brasil e o antigo Banco Bozano Simonsen. Dois anos mais tarde, o grupo argentino Macri, do empresário ítalo-argentino Francisco Macri, assumiu o controle da Chapecó Companhia Industrial de Alimentos, e a partir deste último acordo, o declínio da indústria foi brusco.
A primeira concordata foi pedida em outubro de 1998, após as negociações com o Grupo Macri. No ano seguinte, o grupo argentino e o BNDES firmaram um acordo que esclarecia a divisão entre a maior parte das ações entre as instituições financeiras. Mesmo com os bancos à frente da companhia, não foi possível reverter a crise, que tomava proporções cada vez maiores. A produção foi fortemente afetada, com queda no faturamento, além de atraso de salários e pagamento de fornecedores.
A situação melhorou com a injeção de capitalizações na Chapecó, o faturamento aumentou e a produção normalizou-se, inclusive com vendas, entre os anos 2000 e 2001. Contudo, essa melhora não conseguiu reverter a instabilidade, que se agravou ainda mais nos anos posteriores. De acordo com o processo de falência, a nova crise que se estendeu até 2003 foi ocasionada porque o BNDES e o Grupo Macri aumentaram o tamanho da instabilidade, mas não entendiam a complexidade dos problemas estruturais de competitividade da Chapecó e não conseguiram colocar o plano em prática por falta de capacidade gerencial e estratégica para executá-lo.
No final de 2002, o Grupo Macri renunciou de seus mandatários, deixando a Chapecó Alimentos totalmente à mercê, acarretando na demissão de 4600 funcionários e na paralisação das atividades industriais, em abril de 2003. O segundo pedido de concordata foi impetrado em 12 de janeiro de 2004, na tentativa de recuperar o que ainda restava da companhia.
Embora a crise fosse interna, ela afetou brutalmente todos os dependentes diretos e indiretos da empresa. À época, cerca de sete milhões de frangos morreram por falta de ração e passaram a cometer atos de canibalismo a fim de obter comida. Além de que, os avicultores, fornecedores e, sobretudo, os empregados deixaram de receber seus pagamentos, causando um caos econômico ainda maior em toda a região. Em entrevista concedida à Folha de São Paulo, em 2003, o então presidente do Sindicato dos Criadores de Aves de Chapecó, Valdemar Kovaleski, afirmou que à época havia avicultores que precisaram vender bergamotas nas ruas de Xaxim para pagar a conta de energia elétrica.
Houve uma tentativa de venda para o Grupo Francês Louis-Dreyfus, entretanto não foi concretizada. Em razão de não haver um comprador para as oito unidades industriais, a Chapecó optou por arrendá-las a fim de sanar parte das dívidas exorbitantes. Como resultado, a unidade do município de Chapecó foi arrendada pela Cooperativa Central Aurora Alimentos e a unidade xaxinense pela Globoaves Agroavícola, que assumiu os trâmites somente por alguns dias, mas logo depois cedeu à Diplomata. Além disso, a unidade frigorífica de Cascavel (PR) foi arrendada pela Frango Forte e a unidade de Santa Rosa (RS), pela Alibem Comercial de Alimentos.
Entendendo que não havia mais como proceder com a crise da empresa ou como revertê-la, a juíza da 3ª Comarca Cível de Chapecó, Rosane Portella Wolff, decretou a falência das empresas Indústria e Comércio Chapecó e da Chapecó Companhia Industrial de Alimentos, no dia 29 de abril de 2005. Atualmente, a empresa está convertida na chamada Massa Falida da Chapecó Alimentos, que é administrada pelo advogado, nomeado síndico, Alexandre Brito de Araújo. Os bens da Chapecó, incluindo frigoríficos, fábricas de ração e granjas, são avaliados em R$ 615 milhões e as dívidas acumuladas somam cerca de R$ 1,395 bilhão. O maior credor é o BNDES, com cerca de R$ 467,5 milhões ainda a receber.
CASO DIPLOMATA
Inicialmente, a Globoaves Avícola demonstrou interesse em assumir os trabalhos em Xaxim e houve a celebração do negócio em 17/12/2003 pelo valor de R$ 52.118.000,00. Contudo, no dia 22/12/2003, a Globoaves cedeu à Diplomata os direitos de produção sobre a unidade, já que o efeito ocorreu dentro da lei, 60 dias antes da quebra da Chapecó Companhia Industrial de Alimentos.
Com o frigorífico arrendado, a Diplomata pôde começar os trabalhos e triplicou a quantidade de aves abatidas por dia, para 350 mil. Naquele tempo, a empresa tinha cerca de quatro mil funcionários e mil produtores integrados. Além disso, a fábrica de rações produzia 30 mil toneladas/mês, o incubatório 4,5 milhões ovos/mês e o matrizeiro 750 mil matrizes.
Contudo em 2012, uma instabilidade se instalou na empresa, que atingiu brutalmente a economia de Xaxim. O abalo, que primeiro afetou as pessoas que dependiam diretamente da empresa, ganhou força e se tornou uma dor de cabeça para toda a cidade. Desde aquela época, avicultores, ex-funcionários, transportadoras, além de outros credores, aguardam pelo pagamento das dívidas de todo Grupo Diplomata, que hoje abriga empresas de comunicação, combustíveis e agroindústrias, totalizando R$ 1,6 bilhões.
Na época, várias dificuldades foram enfrentadas pelos avicultores, como a falta de fornecimento de ração, ocasionando a morte de milhares de frangos. Há mais de cinco anos, a Diplomata havia aumentado o abate de aves, fazendo com que os produtores adquirissem empréstimos e financiamentos de aviários, no entanto, a falta de pagamento por parte do frigorífico os levou a contrair altas dívidas com bancos.
Em novembro daquele ano, os funcionários da empresa cruzaram os braços e se manifestaram devido à falta de remuneração dos salários, férias e décimos terceiros. Além disso, com a adversidade do frigorífico, o comércio local teve as vendas drasticamente reduzidas, além de muitas negativações de CPFs.
O frigorífico entrou na Justiça com um pedido de recuperação judicial, ou seja, uma medida jurídica para evitar o decreto de falência. Desde aquele período, ocorrem assembleias gerais de credores, onde foram discutidas possíveis soluções para o pagamento. Uma empresa especializada realizou o balanço patrimonial e o frigorífico teve de readequar as propostas a fim de evitar a falência.
No processo de recuperação judicial, os trabalhadores estariam em primeiro lugar para recebimentos dos valores, já que são assegurados pela lei, por segundo o fisco, ou seja, impostos e bancos, e por último os quirografários, que são compostos pelas transportadoras, avicultores e outros prestadores de serviços.
A Coopercentral Aurora Alimentos interessou-se em assumir os trabalhos, fato que foi confirmado ao final de dezembro de 2012. A cooperativa arrendou a unidade industrial de abate e processamento de aves que pertence à Massa Falida da Chapecó Alimentos. Na época, com a nova arrendatária, os trabalhadores e avicultores integrados a Diplomata ficaram mais aliviados e tranquilos, mas não tinham ideia que essa novela se arrastasse por tantos anos.
No final do ano de 2014, a empresa teve a falência decretada por má gestão e fraudes na administração. Mesmo falida, em 2016, a Diplomata trocou o nome para Dip Frangos e aumentou o abate de aves na unidade de Capanema (PR), de 90 mil para 120 mil aves por dia. A situação teve uma mudança em abril deste ano, quando o Superior Tribunal de Justiça anulou a sentença de falência do Grupo Diplomata e a posse voltou a ser do deputado federal Alfredo Kaefer.
O ministro relator do recurso no Superior Tribunal de Justiça, Luis Felipe Salomão, afirmou que as irregularidades citadas pelo juiz da 1ª Vara Cível de Cascavel (PR), Pedro Ivo Lins Moreira, como paralisação nas atividades, sonegação de informações, sucessão irregular, entre outras, deviam passar por uma investigação e assim, não serviam como base para uma declaração de falência. Agora, uma nova assembleia geral de credores vai determinar o futuro do grupo, progredir com a recuperação judicial, a exposição de um novo plano ou a falência.
AURORA ALIMENTOS
Com a suspensão dos trabalhos realizados pela Diplomata, muitas pessoas que dependiam da empresa ficaram de mãos atadas, mas em novembro de 2012, a Cooperativa Central Aurora Alimentos mostrou interesse em assumir as atividades na unidade produtiva de Xaxim, fato confirmado no final do mês seguinte. O contrato de arrendamento tinha a duração de três anos, com possibilidade de renovação, sendo que para início das práticas avícolas, foi necessário o investimento de R$ 60 milhões, os quais R$ 20 milhões foram destinados à aquisição de duas linhas para retirada das vísceras de aves, recuperação de equipamentos e instalações do abatedouro.
Os R$ 40 milhões restantes foram direcionados a serem usados como capital de giro, com o intuito de financiar a retomada da produção, alojamento de frangos e obtenção de insumos. Em relação ao arrendamento, a Aurora passou a pagar mensalmente R$ 425 mil à Massa Falida da Chapecó Companhia Industrial Alimentos, além de R$ 0,08 por frango que passasse da capacidade de 5 milhões de cabeças/mês ou 238 mil/aves por dia.
A Aurora realizou o processo de recrutamento, seleção e admissão, contudo, priorizou os antigos funcionários da Diplomata que passaram pela agonia de ter os salários atrasados desde meados de 2012, contratando 945 pessoas para trabalhar no frigorífico. Nesta época, as vendas ao mercado interno e externo eram compostas principalmente por cortes e salgados de frango.
A Cooperativa Central Aurora Alimentos tornou-se arrendatária de todo o conjunto pertencente à Massa Falida da Chapecó Alimentos, que incluía fábrica de rações, incubatório, setor de congelamento da unidade industrial, armazéns e granjas-matrizes. Também, cerca de 400, dos 800 antigos produtores da ex-arrendatária, passaram a integrar a cooperativa. Entre janeiro e setembro de 2014, a Aurora faturou, somente com exportação de 21,6 mil toneladas de cortes congelados, cerca de R$ 113,5 milhões.
“A Chapecó ficou parada oito meses na cidade, parecia um deserto isso aqui. Sinceramente, você ia à cidade e dava uma tristeza, porque todo o comércio estava parado, não existia a Rafitec, que hoje é uma potência. O que ia ter? Empresas pequenas que vendiam algumas coisas, mas o restante da cidade era um deserto. Depois, a Diplomata pegou a unidade. Teve muitas pessoas que se obrigaram a ir embora, mas outros ficaram no município.”
Valdemar Mendo, 71 anos
Ex-funcionário da Chapecó
“Quem quebrou mesmo a Chapecó foi o Grupo Macri. Depois veio a Diplomata, que ficou até novembro de 2012, quando foi pedido recuperação judicial. Ficaram todos os transportadores, inclusive eu, hoje transportando para a Aurora, com créditos de R$ 50 mil para cada caminhão, em média, receber da Diplomata, que transportava ração, frango e pintinhos. Eu tenho certeza que jamais vamos receber isso. Não tenho muita confiança que vão pagar. Depois disso, assumiu a Aurora que é uma empresa idônea, uma empresa de nome nacional e internacional. Eu acho que com ela não vai haver problema algum para Xaxim, porque são pessoas responsáveis que estão no comando.”
Jacir Teston
Ex-funcionário da Chapecó
Rua São João, 72-D, Centro
AV. Plínio Arlindo de Nês, 1105, Sala, 202, Centro