No escrutínio civilizatório nada pode marcar mais uma sociedade que o tratamento dispensado aos advogados, sobretudo criminalistas.
A história testemunha uma luta incansável pela própria confraria dos encarregados da defesa de seus semelhantes de separar o juízo que se faz no ideário popular da profissão em relação ao senso ordinário a quem o profissional serve.
Ao longo dos séculos oscila nas sociedades, conforme o grau de seu desenvolvimento, a forma em que se encara a advocacia criminal. Desde a respeitabilidade a exímios oradores encarregado em defender seus semelhantes, a campanhas difamatórias, vis, na linha perversa e mentirosa de que “advogado de bandido, bandido é”.
Nesse palmilhar, o pior momento histórico que vive a advocacia criminal certamente é o presente, eis que encurralado o foi, no trevo que separa, mas também une, em dado ponto, as extremas direitas com às não menos desbordantes esquerdas.
O ressurgimento de hordas de neo facistas que desprezam o arcabouço civilizatório-legal-nacional-e-internacional dos direitos humanos, e militam contra os advogados criminalistas, rivalizam, aliás, somam-se, pasmem, no que há de mais moderno da legislação humanitária como propulsor para inocular veneno vil na advocacia criminal.
Isso porque, se de um lado a extrema direita brada por punitivismo exacerbado contra tudo e contra todos, jogando advogados criminalistas em mesma cesta de quem eles defendem, a esquerda-garantista-seletivista-hipócrita pratica uma espécie de marketing reverso ao pregar direito penal mínimo até a página dois, do tipo “coitados dos latrocidas e homicidas, direitos para eles” em contraste incoerente com a busca incessante por “condenação-por-possíveis-delitos-de-gênero”.
Sublinha-se, por oportuno, que se tem por avanço inquestionável a legislação que passou a recrudescer o tratamento dispensado aos delitos, por exemplo, que tenham mulheres como vítima.
Ocorre, que no campo processual, a premissa milenar da dúvida em favor do acusado e o processo como meio de possibilitar-lhe a produção de sua defesa parece ter rumado nesses delitos de gênero a estraçalhar com tal preceito, bem como com as prerrogativas dos próprios advogados que defendem os acusados neste tipo de querela.
Extrapola-se a legislação preventiva de modo ao desequilíbrio começar na estruturação da acusação, que hoje além de contar com um promotor acusando, tem obrigatoriamente ao seu lado um defensor público ou um advogado (privado ou dativo), quando não os três, a investir contra o acusado se a vítima não for homem, hétero e branco, e, não bastasse esse desiquilíbrio, “aí” do advogado que ousa levantar a voz no uso de suas prerrogativas em defesa de seu cliente, cujo o combo ideológico passou a trazer à reboque processo-quase-que-certo disciplinar na OAB.
A própria OAB hoje parece ter resolução espicaçando a presunção de inocência e mergulhada até as últimas profundidades ideológicas vedando a inscrição na Ordem a meros acusados em processos embrionários a licença para advogar, o que não acontece, parece-nos, em crimes tão ou mais graves que contra mulheres, como pedofilia, homicídio ou latrocínio.
Os calorosos debates forenses, com enfrentamento por vezes ríspidos nos debates, em que os advogados buscam desconstituir a presunção de culpa (sim, a presunção de inocência continua para altos políticos que saqueiam desavergonhadamente os cofres públicos ou para provas de concurso) que acusações em delitos de “gênero” trazem em seu bojo já está a transpassar a relatividade, ganhando ares de absolutismo, não raro, rumando para a criminalização de advogados recentemente, buscando calá-los em procedimentos disciplinares que tem sido deflagrados de forma banalizada na OAB.
Estamos, ao que parece, na fronteira de se criar um aplicativo em que a denúncia em si poderá conceder uma sentença condenatória sem direito algum a defesa. Só falta isso, mais nada!
Em suma, se as comissões de prerrogativas permitirem retirarem o sacro e milenar direito do uso contundente da palavra dos advogados criminalistas, como parece rumar quando a questão é de gênero, restará quem proteger eventuais réus inocentes? E, mais, e quem a proteger os advogados militantes nessa área?
Em tese, a polarização política às raias da insanidade tem feito muito mal à toda sociedade, com a advocacia criminal não tem sido diferente, mas pior, eis que se encontra sitiada, por um lado pela extrema direita que vê em advogados (até precisar de um) como cúmplice dos delitos imputados aos seus clientes, e a extrema esquerda que em questão de gênero está a um passo de exigir a criminalização do direito de defesa, isso põe em risco não só a profissão, mas a razão mesma de existir da OAB, acaso permite essa achaque a prerrogativas dos abnegados colegas criminalistas.
É chegada a hora de dar um basta nessa hipocrisia! Chega!
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