O universo jurídico recentemente tem se debruçado sobre o tema “consequencialismo no Poder Judiciário”, conforme se infere de festejada obra sob tal título coordenada pelos juristas de renome Ives Granda da Silva Martins, Gabriel Chalita e José Renato Nalini publicada pela editora Foco.
Há certas divergências construtivas sobre a questão.
Ives Granda entende que a Constituição da República não abarcou o tema.
Gabriel Chalita advoga pela visão calcada no amor como antídoto ao mal consequencialismo, em suma, por menos dogmática e mais transdisciplinariedade, por menos certezas e mais inquietações, por menos opressão e mais afeto no sopesamento das variáveis possíveis de uma decisão judicial.
José Renato Nalini ao tratar da temática sublinha, no que importa à presente exposição, o manancial de direitos previstos na Constituição cidadã em contrapartida aos poucos deveres nela delineados, bem como o fato de o Brasil ter mais universidades de direito que todos os outros países do mundo juntos, o que parece entender desaguar numa sociedade deveras litigiosa que concede direitos no varejo e prejudica a concessão no atacado, sobretudo pelo alto custo das decisões individuais de saúde nos processos que impacta nas políticas públicas globais, em um país que apenas 1% (um por cento) da população percebe acima de 15.000,00 (quinze mil reais) mensais.
Em síntese, a obra supramencionada procura explorar os vieses da hermenêutica que permitem, por vezes, mais de uma solução juridicamente aceitável para um caso concreto posto, de modo que se deve (ria), na visão dos consequencialistas, aquilatar as consequências em abstrato de cada caminho possível a se tomar, para no fim das contas escolher aqueles cuja as consequências sejam mais profícuas ao bem comum.
Lênio Streck, por sua vez, denuncia em sua célebre obra intitulada Hermenêutica Jurídica, o problema do que ele denomina “solipisismos”, ou seja, atuações personalísticas, recheadas de “tenho para mim”, “sinto que”, que muitas vezes retorcem a tessitura da pirâmide normativa.
De outra vertente, enquanto o subjetivismo é da essência mesma do direito que não tem como prever de antemão todas as nuances dos casos que a Justiça é chamada a equacionar, e já se fala em estudar sistematicamente as consequências das decisões judiciais, por mais razão nos parece é chegada a hora de nos debruçarmos sobre as consequências dos modelos de gestão pública, notadamente em tempos pandêmicos e na era do 5G em que cidadãos no Estado com os melhoras índices de desenvolvimento do País (Santa Catarina no caso) há pessoas comprando ossos de animais que até bem pouco tempo eram descartados nos lixos dos açougues.
O ponto em questão não diz respeito a um “caças às bruxas”, ou a uma crucificação de um ou outro gestor público, muito menos a alguma questão ideológica das esquerdas às direitas, mas de mudança holística de paradigma calcado até então na era oitocentista em que as instalações nababescas eram símbolos do poder das igrejas (essas não nos interessam ao presente ensaio, pois, possuem personalidade distinta do contribuinte e são a rigor sustentadas pelos fiéis) e dos Estados (esse sim, nós pagamos a conta, logo temos todos legitimidade de discutir seus fins e seus meios).
Instrumentos modernos de utilização conjunta de espaços físicos já caíram nas graças da iniciativa privada antes mesmo da pandemia, os chamados coworking, locais alugáveis para atendimentos pontuais presenciais-físicos (até porque o conceito de presença hoje é outro, há a presença-virtual em tempo real além da histórica presença com conotação meramente física) por quem de interesse.
Nessa ordem de ideias, com a pandemia, a prestação de serviços por meio de audiovisual, o chamado tele trabalho, mostrou-se a um só tempo um meio de entregar na ponta muitos serviços públicos com satisfação (não à toa que recentemente o Conselho Nacional de Justiça realizou audiência pública para estatuir o teletrabalho doravante e pós-pandemia para magistratura) e como ferramenta a diminuir o custo de manutenção de espaços físicos.
Ora, é de se questionar se faz realmente sentido o Estado em sentido lato (com todos seus poderes, instituições e empresas públicas) manter diversos imóveis, próprios ou locados, com custos altíssimos de manutenção (luz, água, limpeza, segurança, etc) enquanto é possível reduzir o acervo imobiliário, gerando economia aos cofres públicos, e mesmo assim continuar entregando serviços na ponta por via de tele trabalho e chamadas audiovisuais, aferíveis objetivamente no que tange à produtividade?
Em tempos em que uma simples volta aos centros urbanos denuncia o fechamento de diversos estabelecimentos comerciais, e a consequente e infeliz bancarrota de muitas famílias cujos serviços sustentaram por muito tempo a máquina pública, não seria um acinte o Poder Público manter espaços imobilizados em demasia quando não se faz mais sentido utilitário tais manutenções na era do 5G?
Não se está a pregar o leilão do Palácio da Praça dos Três Poderes em Brasília, ou da Casa Branca nos Estados Unidos ou do Palácio de Buckhingham na Inglaterra, que possuem serventia e simbolismo em níveis históricos-pátrios-respectivos, mas em uma redistribuição inteligente dos espaços físicos (que não gozam de tal estatura de importância estilística-histórica-utilitária) para operar os serviços públicos, com uso compartilhado de prédios onde possível, com redução enfim de custos a serem vertidos aos cofres públicos e a outras políticas que possam efetivamente fortalecer a sociedade, como crédito habitacional ou pagamento de dívidas públicas (precatórios) que a um só tempo esquentam setores econômicos e evitam o desperdícios.
Afinal, com essa crise aguda e mundial, com perdas de vidas e economias, causada pela pandemia e, em contrapartida com as novas tecnologias parece clamarem para o princípio da eficiência (fazer o máximo, com o mínimo) saia da letra somente impressa (Lassale) no art. 37 da Constituição Federal e ganhe vida no mundo real em que um por cento da população do País percebe mais de 15.000,00 (quinze mil reais) por mês, e tantos outros estão comprando ossos de animais para não passarem fome.
O consequencialismo da gestão pública, nessa quadra histórica está por exigir da sociedade civil e do poder público um pacto pragmático por economias num cenário que se assemelha de um pós-guerra pela inflação e crises financeiras pátrias e mundiais decorrentes dos efeitos da crise mortífera do novo coronavírus num mundo que já vê como realidade as tecnologias do 5G.
No prelo, destaca-se obra que está sendo desenvolvida com denodo pela jurista de escol Barriga Verde, Dra. Ana Blasi, que apresentará em breve à comunidade jurídica nacional obra inédita sobre os efeitos das novas tecnologias nas fileiras jurídicas. Rogamos que a moda pegue, e que chegue ideias pragmáticas para melhor realocação dos nossos tributos nos altos escalões responsáveis por executarem políticas de gestão pública.
Enfim, por menos imobiliário que não se justificam mais o custo ao contribuinte e às Instituições, e por mais gestão pública consequencialista, logo atenta efetivamente ao princípio constitucional da eficiência e à implementação das ferramentas inescapáveis da modernidade (tele trabalho, uso compartilhado de espaços, etc.) é o que os novos tempos estão a exigir de todos e todas, sobretudo do Poder Público, não só por economia, mas por respeito ao contribuinte e à sociedade civil como um todo!
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