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Arte & manhas | 'Impercepções'

Por: Luís Bogo
08/12/2021 14:28
Divulgação

Em crônica anterior, escrevi que refletir sobre os acontecimentos e as pessoas sem alguma dose de fantasia tornaria a vida uma sucessão de desacontecimentos enfadonhos. Ao aprofundar-me nesta consideração, percebi que muitas vezes os desacontecimentos são gerados por impercepções.

Talvez você se espante com estas palavras incomuns, mas vou explicá-las: ‘desacontecimento’ é um termo utilizado para definir algo que ainda não aconteceu ou, quem sabe, jamais acontecerá. Impercepção é um verbete que não existia até que eu me visse obrigado a criá-lo. Seria a percepção que se torna consciente tardiamente, quando o momento que exigia o imediato gesto já faz parte do passado, como se tivesse escorrido pelas correntes de um velho relógio-cuco.

A impercepção poderia ter a face de uma página não arrancada do calendário que se amarelou na parede. É apenas lembrança de um evento que merecia reação instantânea, mas que, por alguma apoplexia, deixamos passar sem o menor agir, enquanto o momento desvanecia pelas calhas do tempo como a água da chuva que se recusou a dormir no telhado.

A fatal inação pode acontecer com todas as coisas e situações às quais não damos a devida importância no momento preciso. E são estas impercepções que nos roubam oportunidades não apenas de momentos felizes, mas até mesmo de alterações mais profundas e significativas em nossas trajetórias de vida.

O amor é uma dessas fatalidades que não podemos deixar morrer no nascedouro por descuidada impercepção. Se, de repente, o amor nos atinge o rosto, precisamos imediatamente lhe oferecer a outra face para, na sequência, senti-lo também a alvejar o peito, de forma que o penetre e o encharque tal azeite em algodão.

Ao chegar sem aviso, o amor nos enfeitiça, paralisa. E nos constrange, nos tolhe a liberdade de manifestá-lo, pois todo vocabulário se faz restrito e incompleto para traduzir o sentimento. Sempre faltará a palavra exata que, talvez, venha a se expressar no olhar ou no tremor das mãos ou dos lábios. E a muda emoção muitas vezes inibe a percepção do agudo momento de agir.

Jamais haverá régua ou expressão matemática que mensure a grandeza do amor e, portanto, sua chegada ou despertar se coloca não como um problema que exija solução, mas como um momento que reclama alguma atitude que escape aos rígidos controles da psique. Enfim percebido, o amor materializa-se e apenas passa a existir, surgido do nada, como se houvesse sempre estado ali, antes mesmo de fazer-se a luz.

Guarda a densa e invisível integralidade que se revela potente e incrível, como fosse uma única e milagrosa gota a cair do céu para irrigar todo um deserto.

Ao mergulharmos no amor, surge a sensação de medo, pela insegurança de não se conhecer a sua real profundidade e os mistérios de suas profundezas. Mas quando percebemos que engolimos bastante destas águas, que já fomos tragados por seu poderoso redemoinho, nos vem a paz do sereno afogamento, o mágico desfalecer.

Não me pergunte o que eu quis lhe dizer neste texto, pois prefiro que me diga o que aconteceu com você após a leitura. E que as sutilezas jamais nos passem despercebidas.


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