Até ontem, ontem mesmo, eu achei exagero a indignação de alguns com o posicionamento e as colocações do bispo lá que rezou a “missa” de desculpa do Lula pra enrolar a Justiça. Afirmei que faz mais de século que a opinião das igrejas sobre a administração pública é irrelevante. Que ingênuo.
Ainda bem que eu tenho a grande ventura de conhecer gente esclarecida, que logo me abriu os olhos: “Não quando essa opinião encontra, através do lobby, gente disposta a levar essas ideias adiante dentro do poder legislativo”, “(...)E olhar para as leis, pois a maioria das leis são baseadas em algum valor ou princípio moral, que são (ou foram) influenciadas pelas igrejas”.
Eles tem razão, o laicismo francês se espalhou no início do século passado cortando os cordões umbilicais da igreja com os estados mundo afora e as manteve longe por algum tempo, mas as religiões se adaptaram aos novos tempos, viraram até nicho de mercado e espetáculo circense, entretanto, a mais notória e preocupante adaptação foi à política.
A maioria dos sítios da internet ligados a comunidades religiosas dá conta da intenção da bancada evangélica no Congresso em dobrar o número de deputados federais ligados a igrejas de 93 para 150 e de 3 senadores para 15. Preciso dizer de novo: a bancada religiosa não está preocupada em defender as necessidades sociais ou trabalhar pelo bem geral, ela é tendenciosa, está preocupada mesmo em difundir princípios doutrinários e na manutenção das formas legais de manter suas congregações arrecadando licitamente, uma vez que há tempos se discute no meio tributário a revisão das cortesias da lei a estas instituições cada vez mais ricas, e por causa disso, mais perto do poder.
Veja bem, não é a participação de gente religiosa na política que incomoda, até porque seria antidemocrático, é a tentativa de legislar doutrina ou conceito religioso nas barbas do estado laico! Foi pra isso que o secularismo veio, pra afastar os assuntos de estado dos assuntos da igreja, pois sabemos das consequências fatais de se permitir que religiosos tomem espaço demais nos salões da administração pública e da Justiça, está na história, no passado e no presente.
Tanto isso é relevante que o artigo 19 da Constituição proíbe qualquer ente da federação “estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público” e também “criar distinções entre brasileiros ou preferências entre si”, assim, o Poder Legislativo, como um Poder da União, não pode ser palco de culto ou seja lá o que for de seja lá qual for o credo, é um afronta à lei e ao estado laico essa algazarra de bancada da bíblia.
O ponto crucial aqui é o de não permitir que se legisle ou administre se baseando nos conceitos de ética e moral postos pela religião, esse é o problema, é esse o limite que precisa ser compreendido.
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