A maioria das pessoas já sabe que os anúncios que aparecem em sites e redes sociais são personalizados. É só pesquisar “aspirador de pó” uma vez para ficar semanas recebendo ofertas sobre eletrodomésticos. Mas será que as pessoas sabem o quanto os anunciantes realmente sabem sobre elas? A especialista em exploração de dados da organização Privacy International, Frederike Kaltheuner, resolveu fazer um teste: pediu à empresa de publicidade Quantcast todas as informações que tinham sobre ela.
Você pode nunca ter ouvido o nome Quantcast, mas provavelmente a Quantcast já ouviu (e muito) sobre você. A empresa, com base em São Francisco, coleta informações em tempo real sobre os usuários e afirma conseguir fazê-lo em mais de 100 milhões de sites. É apenas uma das muitas empresas que fazem o direcionamento de anúncios na internet. Em um relatório de 2017, a Acxiom, outra empresa de coleta de dados, dizia oferecer informações sobre aproximadamente 700 milhões de consumidores no mundo, e nossos produtos contêm mais de 5 mil elementos de dados de centenas de fontes.
Empresas de publicidade e corretoras de dados têm silenciosamente coletado, analisado e vendido dados pessoais há décadas, diz Frederike. O que mudou recentemente, contudo, foi a granularidade e invasão de privacidade possíveis.
O detalhamento das informações da Quantcast sobre Frederike, diz a especialista, sugere que os dados não foram obtidos apenas com corretoras de dados, como a Oracle, mas também com a Mastercard e serviços de crédito, como Experian. Algumas das categorias em que ela foi incluída são estranhamente específicas – como viagem e lazer no Canadá (ela diz que esteve no país recentemente, a trabalho), e transações frequentes em restaurantes que vendem bagel. Uma transação inclusive a colocou no grupo de consumidores que gasta muito com álcool em casa.
A Quantcast é uma das várias empresas que terceirizam o monitoramento do comportamento online. Essas empresas, assim como Google e Facebook têm rastreadores em diversos sites em aplicativos, por isso conseguem “montar” seu perfil com base na sua atividade ao longo do dia. Os dados coletados sobre Frederike, por exemplo, dão ideias muito específicas sobre seu trabalho na Privacy International: apenas com o histórico do navegador, a empresa sabe que ela trabalha com tecnologia, segurança e privacidade.
Mas como as empresas sabem tanto sobre nós? Para todos os dados coletados, a Quantcast diz ter obtido autorização para realizar o rastreamento, apesar de não ter um relacionamento direto com as pessoas cujos dados estão sendo compilados – o que significa que as pessoas muitas vezes nem sabem o nome da empresa ou qual a finalidade da coleta e processamento dos dados de navegação.
O problema é que os dados podem ser usados para influenciar e manipular todas as pessoas com precisão. Alguns anos atrás, lembra Frederike, uma empresa de publicidade dos Estados Unidos conseguiu focar em “mulheres a favor do aborto” e enviá-las mensagens contrárias ao procedimento enquanto estavam no hospital. Isso mostra que é tecnicamente possível mirar em grupos muito específicos em momentos específicos e locais específicos.
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