Por Willian Batista Casal
Hoje venho informá-lo acerca de uma tese de grande relevância para nós consumidores de energia elétrica, essa tese trata sobre a cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) incidente sobre a Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão de Energia Elétrica (TUST) e sobre a Tarifa do Uso do Sistema de Distribuição de Energia Elétrica (TUSD), que compõem o valor das nossas faturas mensais de energia elétrica.
Para melhor exemplificar o assunto temos que: a TUSD se refere aos custos relativos ao uso do sistema de distribuição, ao passo que a TUST se refere aos custos de transmissão da energia elétrica. O ponto de entrega da energia elétrica é o relógio medidor (contador), de modo que a energia só será individualizada ao consumidor, caracterizando assim sua circulação e dando ensejo à cobrança do imposto, no momento em que passar por este relógio (contador) e for efetivamente consumida.
Logo, exigir ICMS sobre as tarifas que remuneram a transmissão e a distribuição da energia elétrica (TUST/TUSD), é cobrar de forma não prevista pela legislação regente (constitucional e infraconstitucional).
Até porque não há previsão nem na Constituição Federal nem na Lei do ICMS (Lei Complementar 87/96) para a cobrança do ICMS sobre a Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão (TUST) e Tarifa do Uso do Sistema de Distribuição (TUSD), entre outros itens que também compõe a base de cálculo desse tributo na conta de energia elétrica.
Assim, mesmo sem amparo constitucional ou legal os Estados, em reunião do Confaz, resolveram cobrar esse tributo extra, por conta própria. Os Convênio ICMS nº 117/2004, 59/2005, determinavam que somente os produtores de energia e os consumidores livres deveriam recolher o ICMS sobre a TUST e depois pelo Convênio ICMS nº 135/2005 estendeu essa cobrança para todos os consumidores conectados à rede.
Idêntica orientação vem sendo adotada por algumas unidades federadas a respeito da TUSD, seja por meio de modificações em sua legislação, seja por meio de simples reinterpretação daquela preexistente.
Contudo, nosso ordenamento jurídico é hierárquico e piramidal à guisa do proposto por Hans Kelsen. Logo, as normas estaduais de qualquer natureza (legislativa ou administrativa) não podem se sobrepor à Constituição Federal nem às leis complementares de normas gerais. A autonomia legislativa dos entes federados para tratar de tributos é limitada basicamente por esses dois grandes balizadores jurídicos.
É importante também destacar aos senhores que tramita no Congresso Nacional, a Proposta de Emenda Constitucional nº 285/2004 e o Projeto de Lei Complementar nº 352/2002. A primeira determinando a incidência do ICMS na transmissão de energia elétrica, e a segunda incluindo na base de cálculo do imposto, dentre outros, os encargos de transmissão e distribuição de energia.
Todavia, se é proposta de Emenda Constitucional e de Projeto de Lei Complementar não podem os Estados se anteciparem e cobrarem por conta própria com base em convênios e legislações estaduais que contrariam à Constituição Federal e à Lei Kandir (Lei do ICMS).
Nessa perspectiva, o inciso II do artigo 155 da Constituição Federal estabelece que a incidência de Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) será cobrado sobre a mercadoria tão somente quando ocorrer circulação jurídica de bens, o que pressupõe efetivo ato de comerciar para o qual concorrem a finalidade de obtenção de lucro e a transferência de titularidade. Assim sendo, entendemos que a tributação do ICMS deveria ser somente sobre o valor consumido da energia elétrica, baseado na Tarifa de Energia (TE) consumida. Entretanto, compõe também a base de cálculo do ICMS vários outros itens que tem sido base de cálculo do ICMS, dentre eles a TUST e TUSD que aqui discutimos.
Aliás, a Súmula 166 do STJ reconhece que “não constitui fato gerador do ICMS o simples deslocamento de mercadoria de um para outro estabelecimento do mesmo contribuinte”. Assim, por evidente, não fazem parte da base de cálculo do ICMS a TUST (Taxa de Uso do Sistema de Transmissão de Energia Elétrica) e a TUSD (Taxa de Uso do Sistema de Distribuição de Energia Elétrica)". Nesse sentido: (...) (AgRg no REsp. 1.408.485/SC, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, DJe 19.5.2015).
Portanto, no Superior Tribunal de Justiça – STJ a jurisprudência majoritária é favorável a nós contribuintes, dizendo que a TUST/TUSD não compõem a base de cálculo do ICMS. Todavia, cumpre lembrar que em março de 2017 a Primeira Turma do Tribunal da Cidadania (STJ) manifestou-se pela legalidade da cobrança no REsp 1.163.020. Essa decisão, entretanto, foi sucedida de outras que retornaram o entendimento ora majoritário na Corte, no sentido de que a cobrança de ICMS sobre a TUST/TUSD é ilegal.
Devido a divergência o debate foi levado ao Superior Tribunal Federal – STF. E, em agosto de 2017, julgando o RE 1.041.836, a Suprema Corte brasileira manifestou-se pela inexistência de questão constitucional, competindo ao STJ a definição final da matéria. Em dezembro de 2017 o STJ decidiu por seguir o rito dos recursos repetitivos para solucionar a divergência. O tema foi afetado sob o número 986 e foram escolhidos para o julgamento por amostragem três recursos: REsp 1.692.023, REsp 1.699.851 e EREsp 1.163.020. A adoção do rito dos repetitivos implicou no sobrestamento de todas as ações que versam sobre a temática em território nacional (importa dizer que esse sobrestamento não impossibilita o ajuizamento de novas ações). Em 29/06/2018 o Ministério Público Federal (MPF) manifestou-se no REsp 1.699.851, defendendo a legalidade da cobrança de ICMS sobre TUST/TUSD para o caso de consumidores cativos. Todavia, em 04/07/2018, ao apresentar parecer no EREsp 1.163.020 o mesmo MPF reconheceu a ilegalidade da TUST/TUSD compor a base de cálculo do ICMS, quaisquer sejam os consumidores. Portanto, senhoras e senhores, o prognóstico é fortemente favorável ao contribuinte brasileiro. Já que, mesmo o menos positivo dos pareceres ministeriais reconhece que há uma ilegalidade na cobrança.
Face ao exposto, conclui-se senhoras e senhores ser indevida a exigência de ICMS sobre a TUST e a TUSD, estando o contribuinte legitimado à sua contestação judicial. E, é em razão desses motivos que advogados de todo o Brasil vêm alertando seus clientes e ingressando com ações até então bem-sucedidas (em sua maioria) pedindo a interrupção dessa cobrança extra e a restituição dos últimos 5 anos do que foi pago a maior e indevidamente.
Por fim, todavia, é salutar deixar claro aos senhores leitores que a jurisprudência é majoritária, mas de fato o risco de uma reversão nos Tribunais existe e é preciso ter isso bem claro, por isso a importância de sempre procurar um advogado de sua confiança, preferencialmente um advogado especialista na área, que irá melhor esclarecer os pormenores dessas relações jurídico-tributárias.
* Advogado e professor universitário
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