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MULHER NA PM

Elas provam que gênero não é sinônimo de fragilidade

Policiais militares de Xaxim destacam os desafios do dia a dia e como lidam com o preconceito
Por: Felipe Giachini
09/03/2017 16:28 - Atualizado em 09/03/2017 16:44
Comprometimento e responsabilidade são leis para as PeFems de Xaxim (Fotos: Felipe Giachini/LÊ) Comprometimento e responsabilidade são leis para as PeFems de Xaxim (Fotos: Felipe Giachini/LÊ)

Amor à profissão. Palavras simples que resumem a vida das soldados femininas do 5° Pelotão da Polícia Militar de Xaxim. Desafiadas a enfrentar um universo onde a predominância é masculina, elas não se deixam levar pelos obstáculos diários de uma profissão marcada pelos riscos enfrentados nas ruas e muito menos pelas críticas relacionadas ao gênero. Juceli Marca e Caroline Rodrigues são algumas das mulheres que representam a figura feminina no órgão xaxinense. Elas enfatizam que o trabalho em prol da segurança pública é o mesmo para todos os soldados, mas que isso não impede que ocorram comentários acerca das PeFems, como são conhecidas.

As profissionais não deixam dúvidas quanto à competência na função, que inclusive é bastante elogiada pela comunidade, e encontram umas nas outras o apoio e a segurança que precisam para enfrentar as adversidades que as envoltam na profissão. Com a sensibilidade natural da mulher, com personalidade e força para defender o que fazem com tanto amor, as PeFems acreditam estar cumprindo o papel perante a sociedade e também representando o gênero no cenário militar, afirmando que “a mulher pode ser o que ela quiser”.

Em Xaxim, são oito PeFems que atuam no pelotão. O trabalho divide-se em duas frentes: uma delas é no Centro de Operações da Polícia Militar (Copom), onde elas atendem as ocorrências, acionam as viaturas, organizam relatórios de serviços, etc.; e a outra é na rua, nas rondas ostensivas, a rádio patrulha, no trânsito, etc. Para as soldados, são 12 horas de serviço, numa escala de 12-24 e 12-48 (trabalham 12h, folgam 24h; trabalham 12h, folgam 48h), assim como os homens.

Pioneira no pelotão xaxinense, Juceli Marca, que há 20 anos é policial militar e há 15 está em Xaxim, trabalha atualmente no setor administrativo. Pelo tempo de profissão, em janeiro do ano passado foi promovida a cabo - denominação conquistada por antiguidade na instituição ou por concurso – e, próximo de receber o título de sargento, ela expõe os desafios de ter sido a primeira mulher a compor o grupo. Ela conta que quando iniciou a carreira, ainda em Chapecó, era bastante discriminada pelos colegas, mas principalmente pela própria instituição da polícia. A questão da antiguidade era o que mais camuflava o preconceito, pois a reverência aos mais experientes no quartel é muito respeitada pelos militares.

“Acredito que era um preconceito disfarçado, não apenas por eu ser a novata, mas por ser uma mulher numa profissão ‘masculina’. Não vejo que é uma profissão masculina, pois muitas mulheres desempenham suas funções tão bem ou melhor do que alguns homens, sobretudo em determinados aspectos que nós dominamos mais, como a questão do diálogo, por exemplo: de chegar numa ocorrência de maneira mais calma e saber conduzir uma conversa com mais facilidade, o que faz toda a diferença”. O gesto mais conciliador de abordagens é elogiado pela comunidade e melhorou o trabalho da polícia, situação que é sentida pelas soldados, que regularmente recebem comentários satisfatórios pelas ruas.

Há dois anos, Caroline Rodrigues, 32, ingressou na equipe xaxinense e mesmo com pouco tempo de serviço já sente os reflexos de ser uma minoria na instituição. Ela é enfática quando afirma que o treinamento é igual para todos e que está tão preparada quanto os colegas. Piadinhas irônicas e frases maldosas a respeito das soldados já não a impressionam mais, pois já sabe como lidar com esse tipo de comportamento. Nova na polícia, Caroline acredita que existem outras formas para corrigir algumas falhas e auxiliar de alguma maneira, mas o que acontece é que muitos colocam as responsabilidades sobre o gênero.

“Nunca ouvi algo diretamente a mim, mas algumas já ouviram na ‘cara dura’. Já fiquei sabendo por PeFems de outro pelotão que ouviram comentários dizendo que elas não deveriam ganhar o mesmo salário que eles e que em uma ocorrência de risco eles vão sobreviver mais do que elas, por exemplo. Atualmente é mais raro presenciarmos esse preconceito, afinal eles estão aceitando mais a figura da mulher lado a lado com a deles.”

Caroline destaca que quando as mulheres escolhem essa profissão é de se esperar algumas atitudes machistas, pois nesse mundo predominam os homens, mas que não imaginava que seria tão forte. É reconhecido que existem algumas diferenças entre homens e mulheres, mas isso não incapacita ambos de desempenharem qualquer tarefa, afinal “todo mundo pode fazer tudo de uma forma ou de outra. As atitudes podem não ser as mesmas, mas o objetivo é sempre o mesmo, em nosso caso, prezar pela segurança pública”, afirma.

DELICADEZA PRESERVADA

Quanto à vaidade feminina, em nenhum momento elas deixam de se sentir mulheres. Mesmo que com certas restrições, que antigamente eram mais pesadas nesse quesito, elas não deixam de passar um batonzinho, um lápis no olho ou de fazer a unha. Antes do recente regulamento, elas não podiam pintar as unhas com cores fortes, tinham de andar com o cabelo totalmente preso e maquiagem mais discreta, mas com as novas regras, elas sentem que estão conquistando certa liberdade na polícia. Elas já podem deixar o cabelo mais solto, com um rabo de cavalo ou uma trança, não há mais tanta restrição em relação à maquiagem e nem à cor de esmalte, o que para Juceli não influencia muito, pois prefere manter a discrição. “Me acostumei com aquele jeito, mas vejo que as meninas se maquiam se maneira mais forte. Acredito que isso não deve influenciar no trabalho, pois a gente tem o direito de se sentir bonita no ambiente de trabalho, até porque estamos representando a PM”.

UNIÃO ENTRE MULHERES

Mesmo com as dificuldades enfrentadas por conta do gênero, com a chegada das novas policiais femininas elas encontram o apoio que precisam umas nas outras e confiam que juntas podem superar qualquer preconceito. Com o passar dos anos, é perceptível para Juceli que os novos soldados já vêm com a ideia de igualdade de funções. Ainda segundo ela, as pessoas estavam acostumadas com a presença masculina no militarismo, mas o tempo e a dedicação delas mostraram que elas têm a mesma atuação e os homens estão comprovando isso. “Hoje em dia mudou bastante e a vinda das meninas para cá foi uma bênção. A gente se sente mais unida e provamos que a união faz a força”, comenta.

A representatividade da mulher na Polícia Militar é defendida pelas PeFems, que incentivam outras mulheres a ingressarem nesse campo. Em reuniões com grupos de mulheres de Xaxim e também da região, por exemplo, elas costumam participar para marcar a presença das profissionais na sociedade.


PAIXÃO PELO OFÍCIO


CABO JUCELI

O desejo de dedicar a vida em defesa da sociedade se fez presente na vida da cabo Juceli Marca, de 38 anos, desde a infância. As brincadeiras com os seis irmãos em uma comunidade do interior de Quilombo são motivos de saudade da policial, que escolheu a profissão ainda aos nove anos. Mesmo num ambiente de muita união, alguns conflitos entre a família afloraram nela o sonho de lutar para proteger os mais próximos. Em conversas com a mãe, ela sempre deixou claro a vontade de trabalhar com a segurança pública, mas era contestada, pois como não tinham muitas mulheres policiais e a profissão era arriscada, a vontade ficou apenas na memória.

Juceli cresceu e, ainda durante o período escolar, trabalhou num escritório de contabilidade, área distante da que abraçaria mais tarde. Ao concluir o Ensino Médio, mudou-se para Chapecó para fazer cursinho pré-vestibular, com pretensão à área que já atuava. Certo dia ficou sabendo que teria um concurso só para mulheres para ingressar na PM. Ela não pensou duas vezes e se inscreveu, pois naquela época ainda não era necessário ter formação superior para entrar na polícia - desde a última regulamentação, em 2013, o diploma universitário passou a ser obrigatório. Juceli passou e ingressou na primeira escola de formação feminina do Oeste, intitulada Pioneiras do Oeste, e foi uma das 40 mulheres que passaram a atuar no órgão em Chapecó. Por cinco anos dividiu a rotina pelas ruas e também no Copom.

No processo de transferência optou por Xaxim, pois tinha um irmão que morava na cidade e por ser um local mais calmo para criar o filho Vitor, na época com dois anos. Portanto, ela e o esposo Ronaldo fizeram as malas e partiram para o novo lar. Hoje o casal tem dois filhos, o Vitor e a Sabrina. Quanto ao possível estranhamento em ter uma policial como companheira, Juceli destaca que para o marido isso nunca foi problema, afinal ele é filho de PM. A carreira longa de Juceli fez com que a soldado fosse promovida a cabo e, no fim deste ano, receberá o cargo de sargento.

“Me sinto muito orgulhosa e feliz por ser PM, por servir as pessoas, à polícia e ao Estado. Em algum momento pensei em sair dessa carreira e fiquei um ano fora para ver se era isso o que eu queria mesmo. Voltei com a certeza de ficar e é o que quero fazer pelo resto da vida.”


SOLDADO RODRIGUES

Era com os meninos que a soldado Caroline Rodrigues, de 32 anos, mais passava o tempo na infância. Natural de Santo Ângelo/RS, quando criança ela se dizia um “moleque”, pois subia em árvores, brincava na terra, jogava bola e outras atividades que requeriam esforço físico. Ela não fazia ideia do que queria para sua vida no futuro, mas ao participar de uma palestra com militares, aos 12 anos, sentiu algo falar mais alto dentro de si. O encanto pela profissão e a insistência para que sua mãe a levasse ao batalhão do exército da cidade para conhecer o ambiente que a atiçava foi tomado pela frustração e desmotivação, oriunda dos comentários de um oficial, que não acreditava que a jovem levasse jeito para a coisa, raciocínio que foi acompanhado pela mãe. Ele dizia que ela deveria continuar com os estudos e quem sabe tentar um concurso para entrar no exército, mas com as restrições que o órgão oferece às mulheres, como colocá-las na área da saúde, as desencorajou, afinal ela não tinha vocação para isso.

Ao chegar ao fim do Ensino Médio, Caroline optou por cursar a faculdade de Química Industrial de Alimentos. Ao chegar ao terceiro semestre tinha a certeza de que não era o que queria. No ramo, Caroline trabalhou por sete anos num abatedouro de aves em Itapiranga até chegar a um ponto em que não queria seguir na profissão. Nesta época, uma colega disse que o irmão dela havia passado em um concurso da PM. A informação resgatou o sonho de Caroline em tentar a carreira militar. Assim que soube da abertura de novo concurso, ela não perdeu tempo e se inscreveu, mesmo que já estivesse com 29 anos, próximo a idade limite pra ingressar na polícia, que é 30 anos. Caroline passou no concurso e ao participar da reunião com as convocadas ela teve a certeza de que era o que queria.

O curso de formação foi em São Miguel do Oeste e, após concluí-lo, recebeu uma lista de cidades com vagas conforme a colocação que obteve no concurso. Entre as cidades de Xaxim, Maravilha, Itapiranga e Seara, ela escolheu Xaxim, até por já ter ouvido de outras policias que era uma cidade boa para trabalhar, com custo de vida não tão alto e onde tinha um bom grupo de soldados. Escolha que há dois anos proporciona à Caroline o sentimento de estar no lugar certo e na profissão certa.

“É uma satisfação ser uma PM e não trocaria de profissão, pois é um aprendizado diário. A gente tem de se superar a cada dia e provar que somos capazes de estar em qualquer lugar. A mulher pode escolher a profissão que ela quiser, que acha que tem capacidade e dom para desempenhar aquele papel. Com estudo e preparo qualquer um pode fazer o que quiser.”


FIQUE SABENDO!

Para cuidar dos feridos durante a Segunda Guerra Mundial, as mulheres foram incluídas nos serviços de apoio aos militares, ideia que foi acatada no Brasil na década de 1950 e só a partir de 1980 que começaram a ingressar nas Forças Armadas. Em Santa Catarina, a figura da mulher se fez presente na Polícia Militar em 1983 após entrar em vigor a Lei nº 6.209, de 28 de fevereiro de 1979, sancionada pelo governador Esperidião Amin, que permitia a inserção das mulheres na polícia. Conforme a Associação de Praças o Estado de Santa Catarina (Aprasc), o primeiro Pelotão da Polícia Militar Feminina no Estado foi criado em 10 de fevereiro de 1983, e somente em junho deu início ao Curso de Formação de Graduadas Femininas e o Curso de Formação de Oficiais, que graduou 31 soldados e cinco oficiais femininas. Nos primeiros anos elas só podiam atuar no atendimento a ocorrências de auxílio a crianças, idosas e mulheres das comunidades.

A formação militar era e ainda é muito semelhante a dos homens, com algumas pequenas diferenças no treinamento físico, mas a duração é de nove meses para todos. Até o fim do ano de 1998, as PeFems pertenciam a um grupo separado ao dos homens, situação que mudou com a unificação dos campos de atuação, dando o direito às mulheres de disputarem as mesmas vagas com os homens em qualquer área da PM, o que ampliou a inserção delas em diversas áreas da corporação, como na Polícia Militar Rodoviária, Polícia Ambiental, Polícia Montada, Canil, Bope, presídios e o Hospital da Polícia Militar. Atualmente, a PMSC tem cerca de 900 policiais femininas, enquanto o número de homens chega a cerca de 12 mil. Situação que atende à Lei nº 587, de 14 de janeiro de 2013, que consta que o número de mulheres nos quadros militares não deve passar dos 6% em relação às vagas masculinas, diferente de estados como Paraná e Rio Grande do Sul que atendem ao artigo 5 da Constituição Federal, de que “todos são iguais perante a lei”, disponibilizando 50% das vagas.


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